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A Era da (Des)informação: Lincoln, o Delírio Digital e a Sedução da Mentira

É atribuída a Abraham Lincoln, 16º presidente dos Estados Unidos, a seguinte frase: “Você pode enganar todas as pessoas por algum tempo, e algumas pessoas o tempo todo, mas não pode enganar todas as pessoas o tempo todo.” Se Lincoln pudesse vislumbrar o labirinto virtual em que nos encontramos, onde a verdade se perde em meio a um turbilhão de informações contraditórias, talvez ele repensasse sua afirmação. Afinal, as redes sociais, com seus algoritmos e vieses de confirmação, criaram um ecossistema propício para a disseminação de mentiras e delírios, desafiando a própria noção de realidade.

Pablo Marçal: Um Espelho da Vaidade Digital

O debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, promovido pela Rede Bandeirantes de Televisão em 8 de agosto, serve como um exemplo emblemático dessa era da (des)informação. O candidato à prefeitura de SP, Pablo Marçal, conhecido por suas declarações polêmicas e postura ególatra, encontrou nas redes sociais um palco ideal para amplificar sua voz e construir uma persona grandiosa. Seus seguidores, imersos em suas bolhas ideológicas (criadas pelo algorítmo de oferta de conteúdos relevantes das redes sociais), aplaudem suas bravatas e endossam suas visões distorcidas da realidade.

Foto do candidato à prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, em gesto alusivo ao consumo de cocaína por seu opositor Guilherme Boulos.
Reprodução

Mas o que leva as pessoas a acreditarem em discursos tão evidentemente desconectados da realidade? A resposta está na complexa teia de fatores psicológicos e sociais que moldam nossas crenças e comportamentos online. A necessidade de pertencimento, a busca por significado e a aversão à incerteza nos tornam vulneráveis à sedução de narrativas simples e atraentes, mesmo que elas sejam falsas ou perigosas. O caso de Pablo Marçal, com sua persona grandiosa e declarações polêmicas, ilustra como a vaidade digital pode distorcer a percepção da realidade, tanto para o indivíduo quanto para seus seguidores.

O efeito da câmara de eco e o perigo do delírio digital

As redes sociais funcionam como verdadeiras câmaras de eco, onde somos expostos apenas a informações que confirmam nossas crenças pré-existentes. Algoritmos sofisticados analisam nossos dados e nos mostram aquilo que queremos ver, criando uma ilusão de consenso e reforçando nossas convicções, por mais equivocadas que sejam. Nesse ambiente, figuras como Pablo Marçal prosperam, alimentando-se da atenção e validação de seus seguidores. Suas falas grandiosas e promessas mirabolantes encontram eco em mentes ávidas por esperança e soluções fáceis para problemas complexos. A repetição constante dessas mensagens, aliada à falta de contrapontos e ao descrédito da mídia tradicional, solidifica a crença em suas narrativas, por mais absurdas que pareçam.

Essa dinâmica, potencializada pelos algoritmos e pela cultura do “cancelamento”, pode levar ao isolamento social e ao agravamento de condições psicológicas preexistentes. A linha tênue entre a confiança e o delírio pode se romper facilmente no mundo virtual. O excesso de informações, a velocidade das interações e a falta de contato humano genuíno podem levar à distorção da realidade e à formação de crenças delirantes. No caso de Pablo Marçal, a mania de grandeza, a distorção da realidade e a dificuldade em aceitar críticas são sinais alarmantes. Suas redes sociais se transformaram em um palco para a encenação de um personagem grandioso e infalível, alimentado pela adulação de seus seguidores.

A Ilusão do Narcisista e a busca pela verdade

Enquanto acompanhamos a saga de Pablo Marçal, é crucial refletirmos sobre nossas próprias vidas digitais. Afinal, a Ilusão do Narcisista não se limita a figuras públicas; ela pode estar presente em cada um de nós, de forma sutil e insidiosa. A busca incessante por likes, a necessidade de validação constante e a incapacidade de lidar com críticas podem ser sintomas de um ego inflado e fragilizado.

Como o Professor José Geraldo de Souza Júnior sabiamente nos elucidou em uma fala públilca em 14 de junho de 2023, onde ele diz que “o real não é aquilo que existe, mas é a representação que fazemos do que conseguimos ver”. Essa frase nos convida a questionar nossas próprias certezas e a reconhecer que nossa visão de mundo é limitada e subjetiva. O que consideramos verdade absoluta pode ser apenas uma ilusão, uma construção mental baseada em nossas experiências, crenças e preconceitos.

Muito provavelmente você deve conhecer alguém próximo a você que tem fortes convicções sobre a vida, as quais você acredita serem absurdamente equivocadas. Isso quer dizer que um dos dois está errado ou que essa verdade que cada um dos dois vê é o produto do que sua cognição pode produzir, estando cada um certo em sua propria visão de mundo. Nesse contexto, é importante entender que algumas pessoas realmente estão muito longe de uma realidade que elas nem conseguem ver. Se isso está ocorrendo, é importante que ela consiga equilibrar sua visão de mundo com seus pares, ou haverá um risco significativo de isolamento social.

Ajudar quem não se vê em sofrimento: O desafio da autoconsciência

A saúde mental, como um rio subterrâneo, molda nossa percepção de nós mesmos e do mundo, mesmo quando não a notamos. Mas e quando alguém, como Narciso à beira do lago, não reconhece seu próprio reflexo turvado? Como estender a mão para quem não vê a necessidade de ajuda? A autoconsciência, bússola interna que nos permite identificar nossos estados emocionais e mentais, pode ser ofuscada por vieses, traumas e pressões sociais. Essa névoa interna impede que alguns reconheçam seus próprios desafios psicológicos, dificultando a busca por ajuda. A resistência à mudança, como uma fortaleza erguida em torno da dor, é comum em quem não se vê em sofrimento. O medo do desconhecido, a negação e a relutância em confrontar a própria vulnerabilidade criam barreiras que exigem paciência e empatia para serem transpostas.

Imagem gerada por IA

Oferecer apoio a quem não o busca é como construir uma ponte sobre um abismo. A confiança e a conexão genuína são os pilares que sustentam essa estrutura. Ao criar um espaço seguro e acolhedor, livre de julgamentos, é possível plantar as sementes da autoconsciência e da aceitação. Assim como um espelho revela nossa imagem, a introspecção nos permite enxergar nossos padrões de pensamento e comportamento. Incentivar a autoexploração, através de perguntas e reflexões guiadas, é como acender uma lanterna no labirinto da mente, revelando caminhos antes ocultos. A jornada da cura não é uma corrida, mas uma maratona. Ao equipar o indivíduo com ferramentas de enfrentamento e estratégias de resiliência, estamos lhe dando um mapa e uma bússola para navegar pelas turbulências da vida.

A decisão de buscar ajuda é um ato de coragem, um passo em direção à autodescoberta e ao bem-estar. Para quem resiste à mudança, esse primeiro passo pode parecer um salto no escuro. Mas, com apoio e compreensão, a jornada da cura se revela como um caminho de transformação e crescimento. Em suma, ajudar quem não se vê em sofrimento é um desafio complexo, mas não impossível. Ao cultivar a empatia, a paciência e a esperança, podemos estender a mão e guiar aqueles que se perderam no labirinto da própria mente em direção à luz de um caminho de equilíbrio.

Para romper com a Ilusão do Narcisista e o delírio digital, é preciso cultivar a humildade e a abertura ao diálogo. Questione suas próprias convicções, busque diferentes perspectivas e esteja disposto a mudar de opinião diante de novas evidências. Lembre-se de que o mundo virtual é um reflexo distorcido da realidade, e que a verdadeira felicidade e realização residem na conexão genuína com o outro e na busca constante pelo autoconhecimento.

Créditos da imagem de capa: Reprodução/Grok/FlaDogLover/X